
A Associação Marinha em Movimento (AMM), concretizou no passado sábado, 1 de Fevereiro, o seu XII Ideias em Movimento, uma jornada sobre o património da antiga Fábrica Escola Irmãos Stephens (FEIS).
Apesar da tentativa infrutífera de estabelecer uma efetiva parceria com o município da Marinha Grande na organização desta atividade e que simultaneamente permitisse o acesso do público às instalações fabris ocupadas pela Cristaleira Mortensen, propriedade do Município desde 13 de dezembro de 2018, esta visita acabaria por ser impedida, por este entender não estarem reunidas as condições de segurança para uma visita coletiva, naquele que teria sido uma saudosa viagem ao passado para muitos dos presentes.
A jornada teve início na envolvente exterior do complexo da antiga FEIS e foi sem dúvida, para todos os presentes, uma oportunidade de aprofundar os conhecimentos sobre a história e importância do nosso património cultural.
Não obstante as condições climatéricas adversas, acorreram à iniciativa cerca de uma centena de pessoas, para ouvir aquele que é porventura o mais prestigiado investigador da história e arqueologia industrial do Vidro em Portugal, o Prof. Jorge Custódio, numa riquíssima e apaixonada narrativa, sobre o glorioso passado da Marinha Grande e de como uma “fábrica” esteve na sua génese, revelando que a missão confiada pela coroa portuguesa a Guilherme Stephens em 1769, extravasava a construção da Real Fábrica de Vidros da Marinha Grande, incumbindo-o de organizar o Pinhal do Rei, em ordem à sua rentabilidade e cuidado.
A conferência que se seguiu à visita versou, pelo Prof. Jorge Custódio, sobre a história e génese da FEIS e ainda sobre o Museu do Vidro. Para Jorge Custódio a preservação do património FEIS, não só da sua actual componente cultural, mas também da sua componente mais fabril, permitirá recuperar o conceito de Museu do Vidro de Portugal, transcendendo o atual e estrito quadro municipal, sem deixar de ser do município. Um museu que incorpore o conceito actual de Museu, requer, defende, ser um «museu total» etno-social, uma construção que deve ser obra da comunidade com a participação de todos, e que incorpore diversas componentes: Património, História, Arte, Investigação, Lazer, Educação, Curiosidade, Especialidade e Inovação. O Museu do Vidro de Portugal deve ter uma estratégia de desenvolvimento industrial e cultural local e ter a capacidade de salvaguardar a conservação dos imóveis e dos móveis associados à sua missão, bem como preservar o património imaterial, através dos seus obreiros, os artesãos e mestres vidreiros, muitos deles ainda vivos.
A segunda parte da conferência, a cargo da arquiteta e urbanista Renata Barbosa, demonstrou através de exemplos práticos, realizados em Portugal, que as estruturas industriais se podem compatibilizar com novos usos, permitindo a salvaguarda do Património. Referiu os exemplos: de Tomar, com a reabilitação das diversas unidades fabris adossadas à Levada de Tomar, e que constituem actualmente o Centro Cultural da Levada de Tomar; da reabilitação do complexo industrial da antiga fábrica da Oliva em São João da Madeira, que recuperou e transformou as estruturas industriais, compatibilizando-as com novos usos, traduzidas no OLIVA CREATIVE FACTORY, um pólo multifacetado com equipamentos e espaços diversos (Incubadora de empresas, startups, oficinas artísticas, auditórios, centro de negócios e co-working, entre outras estruturas de apoio e até de comércio).
Após as apresentações dos oradores convidados seguiu-se um animado debate onde ficou patente a vontade dos presentes, em proteger um património único, na história da Marinha Grande e de serem parte integrante das decisões que venham a ser tomadas, tendo inclusivamente sido referenciada a Carta de Princípios sobre a Salvaguarda do Património, ratificado por todos os estados membros do Conselho da Europa (Faro 2005), onde é referido “que cada pessoa, individual ou coletivamente, tem o direito de beneficiar do património cultural e de contribuir para o seu enriquecimento;”.
Ficou clara a necessidade de antes, de se lançarem ideias para o destino a dar a este espaço, se empreender uma metodologia que conduza ao reconhecimento, compreensão e abrangência de todo o património FEIS, do que ainda exista e possa ser preservado nas estruturas fabris da antiga Mortensen, para que uma futura intervenção salvaguarde a integridade do seu património.
Perante o compromisso assumido publicamente pelo município, na comunicação social, por ocasião da aquisição das instalações da antiga FEIS, há mais de um ano, “em encetar uma ampla e alargada discussão pública sobre esta matéria antes de qualquer decisão”, acabou por ser uma associação de índole cívica, AMM, a, mais de um ano depois destas palavras, trazer para a discussão pública um tema crucial na herança cultural e identitária da Marinha Grande e na qual a antiga FEIS é e será um dos seus mais valiosos activos.



